terça-feira, 2 de abril de 2013

Ser ou não padre, eis a questão



No passado Domingo de Páscoa, na rubrica “Quando for grande quero ser…” do Jornal da Noite da SIC, Rui Reininho dizia que queria ser padre. Não o conheço pessoalmente, para saber se iria ser um bom ou mau padre, apenas, e do que tem sido sua vida pública, certamente iria ser um padre rebelde. Mas até rebelde é o Papa Francisco – no bom sentido e do meu ponto de vista.
Vem este assunto lembrar-me, de meu tio Orlando, marido da irmã de minha avó paterna Bernardete.
O meu tio Orlando, foi a primeira pessoa, que vi e que me lembre, falecer de “doença prolongada”. Na altura, o termo “cancro” pouco ou nada era utilizado, talvez não chamando a “coisa” pelo nome, suavizasse mais o espírito do doente e de seus familiares.
Não sei precisar minha idade, era pequeno. E tenho dúvida, se meus dois irmãos mais novos eram nascidos. Talvez, só, o mais novo não o fosse, não sei, nem fui averiguar.
O que lembro bem foi da visita que lhe fiz, na ASMECI – Associação de Socorros Mútuos dos Empregados de Comércio e Indústria, na Rua da Palma e o que me disse, naquele dia.
João Pedro! Gostaria que fosses padre…” Assim!... Sem mais…
Tenho a certeza que fiquei calado – é de meu timbre – mas não sei reacção de minha feição. Sei apenas, que aquelas palavras ficaram para sempre na minha memória e não mais o voltaria a ver, falecendo dias depois.

Ao longo de minha vida, já questionei várias vezes, no silêncio de meus pensamentos, este tema. Aliás! O silêncio que tanta vez necessito para me encontrar, já me fez pensar entrar num retiro espiritual, daqueles onde se vive durante algum tempo sem contacto com o exterior. Assim se pensa, quando pouco nos identificamos, com o Mundo que nos apresentam.
Não sei se teria vocação para seguir o sacerdócio. Sei que meu espírito pertence a Deus e minha alma aos sentimentos. O corpo, esse, segue o caminho que ambos lhe dão. O caminho que desejo, pensando ser o da verdade, para cumprir meu papel na Terra – que não sei qual é…

Um dia, um amigo, em conversa, disse que gostava de falar comigo, de desabafar, pelo simples facto de eu ser bom ouvinte. Ainda hoje o faz. E eu escuto-o…
Verdade que sou mais de escutar, que de falar. Falar!? Estritamente, só o necessário, sou de poucas palavras, chegando a ser duro e frio, confesso!... E às vezes nenhuma palavra me oferece dizer. O silêncio também diz muito. Mas o que gosto mesmo é escutar, ouvir os outros, beber histórias, palavras. Percebi, que a ouvir, aprende-se muito acerca do carácter da pessoa que está do outro lado e também é o ponto de partida para se perceber algo mais.... Não me sinto “confessionário”, mas são tantos os “segredos” que um dia levarei comigo… Minha boca é um túmulo e só assim, fico bem comigo, respeitando o outro.    

Não tenho o dom da palavra, como se quer a um padre, muito longe disso, mas tento sempre reconfortar quem vejo necessitar de ajuda. E meu Deus! Quantas almas, andam perdidas neste Mundo, sem ninguém perceber, nem notar que necessitam de desabafar. E por vezes estão tão perto…
Compreendo que para muitos, escutar seja difícil. O egoísmo domina o Mundo e quem tem o dom da palavra tem o controlo – pena o utilizarem para seu próprio proveito invés para o bem dos outros – salvo raras excepções. Bastava conceder o fio de conversa e não querer dominar impondo temas, mudando assuntos que não lhe interessam. E perde-se a oportunidade de ajudar.

Como disse, não tenho o dom da palavra, nem sequer o da escrita. Fosse escritor e um livro de Filosofia da Vida já teria escrito… Quantas horas de sono já troquei pelo Pensar, pelo dissertar no silêncio dos lençóis, no sossego do leito, falando com Deus.

Não sei se seria bom padre. Um padre pressupõe também socializar, ter protagonismo social. Não gosto de protagonismo! Não dispenso meu sossego, faz-me confusão olhares centrados, focados em mim – egoísta também sou, estão a ver!? Sou Humano!
Se fosse padre, queria, forçosamente ser missionário. E falar com os peixes…
Não sou padre, Tio Orlando! Desculpa desiludir-te... Mas não me parece que seja esse meu desígnio, no entanto, sigo minha vida, escutando e tentando ajudar, com sua força. Força de Deus.  

Nota: Para ser padre, pressupõe-se muita outra coisa que entra no registo "concordo" e "não concordo". Outros assuntos e debates, que não quis entrar aqui. Limitei-me a características pessoais que poderiam ou não "encaixar". E nada tenho contra o ser-se padre, desde que levem a missão com respeito. 

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